Há pouco menos de um ano, uma notícia atraiu todos os holofotes do mundo do futebol. Em um manifesto assinado por 12 das principais equipes europeias, incluindo o Chelsea, foi anunciada a intenção de criar uma Super Liga Europeia. De antemão, a liga reuniria os principais clubes do continente para organizar um torneio que substituiria a atual Champions League – com vagas cativas aos seus fundadores.
Como se sabe, em menos de 48 horas o manifesto deu lugar ao caos provocado por ameaças de sanções e a desistências quase imediatas do projeto. No entanto, Juventus, Barcelona e Real Madrid seguem até hoje membros desta nova liga e confiantes no projeto. Mais do que isso, nas últimas semanas novas ameaças de tentar reduzir o controle da UEFA através dessa Superliga tiveram repercussão na imprensa.
Quando o projeto tomou os holofotes ano passado, o Chelsea estava às vésperas de um confronto contra o Real Madrid, assim como agora. Porém, agora, só os merengues seguem ativos no projeto, de forma que, até mesmo, Florentino Pérez, presidente do clube, seria também o presidente da nova Liga. Antes do novo confronto contra os espanhóis pelas quartas de finais da Champions League, o Chelsea Brasil resgata a discussão e os desdobramentos da Superliga Europeia.
O manifesto
No dia 18 de abril de 2021, o Big Six do futebol inglês enviou um comunicado de forma simultânea à imprensa juntamente com, Juventus, Milan, Internazionale, Barcelona, Real Madrid e Atlético de Madrid. Em outras palavras, os 12 clubes assinavam um manifesto pela criação de uma Superliga Europeia. Tentando pôr em prática uma ideia que já era ventilada há algum tempo e que consistia em dar aos clubes a autonomia para organizar uma nova competição europeia.
Em suma, o objetivo era garantir mais confrontos entre as equipes que representam grande parte da elite do futebol europeu. Reduzindo a participação de equipes menores – ou menos midiáticas -, esperava-se aumentar os valores de transmissão e patrocínios. Com isso, aumentando as receitas dos gigantes europeus.
Para justificar esta ação, o impacto da pandemia nas receitas foi o responsável conveniente encontrado pelos seus representantes. Em especial, Florentino Pérez usava esse fator como escudo para as críticas imediatas. Além de Pérez, Andrea Agnelli – presidente da Juventus – e Joan Laporta – presidente do Barcelona – despontavam (e se mantém) como as lideranças do movimento.
Repercussão e ameaças de sanções
Tão logo o manifesto foi divulgado, as críticas surgiram. Entre torcedores e imprensa especializada, o fato da nova liga criar um “clube privado” em detrimento do mérito esportivo para se classificar a uma competição continental era o principal motivador da rejeição. Somado a isso, a possibilidade da Super Liga impactar na relevância das competições nacionais.
Além da imprensa, o manifesto foi condenado de imediato pelas federações e ligas da Inglaterra, Espanha e Itália, além da FIFA, da UEFA, e da ECA, Associação dos Clubes Europeus. A ECA, então presidida por Agnelli, promoveu a renúncia do italiano e a retirada dos doze clubes de seus quadros. Somada à esfera esportiva, políticos também se posicionaram contra o movimento, em especial o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, e o presidente francês, Emanuell Macron.
Após a reação imediata, ficou evidente que os clubes ingleses estavam insatisfeitos com a repercussão. Nesse sentido, uma das principais ações veio da torcida blue. Em dia de jogo contra o Brighton pela Premier League, muitos torcedores do Chelsea se reuniram em protesto em frente a Stamford Bridge. Provocando até o fechamento de ruas, foi necessária até a presença de Petr Cech para acalmar os ânimos do protesto.
A debandada inglesa
Enfim, com a repercussão negativa crescente, a imprensa britânica já anunciava que o Chelsea estava prestes a se retirar do projeto. No entanto, antes mesmo dos Blues, os demais ingleses anunciaram um a um a desistência em fazer parte da nova liga. Por fim, somaram-se a eles Milan, Internazionale e Atlético de Madrid. Após a partida contra o Brighton, o Chelsea divulgou a sua retirada através de seu site oficial.
Dessa forma, com apenas três clubes resistindo, o projeto estava destinado a ser engavetado. No entanto, mesmo com a desistência, os clubes ingleses envolvidos receberam sanções. Em conjunto, o Big Six desembolsou 22 milhões de libras como um gesto de boas intenções. De acordo com a divulgação na época, este dinheiro seria direcionado a projetos sociais e de base.
Além disso, em caso de nova tentativa de rompimento entre esses clubes e as ligas atuais, uma multa de 25 milhões de libras e a dedução de até 30 pontos na Premier League foram estabelecidas como punição. Apesar de não ter se pronunciado abertamente, a impressão era de que Roman Abramovich já desconfiava do sucesso da Superliga. Só que o temor de perder a oportunidade que os principais rivais estariam aproveitando pesou na decisão.
Os três obstinados
Em agosto de 2021 as nove equipes que desistiram da Super Liga foram readmitidas pela ECA. “A direção da ECA também recebeu o compromisso dos clubes readmitidos em se envolver na missão de desenvolver o futebol de clubes na Europa, defendendo o interesse aberto e transparente de todos, não de poucos“, declarou a associação no documento divulgado na ocasião.
Contudo, Real Madrid, Barcelona e Juventus seguem fieis ao projeto até hoje. O site oficial da empreitada segue ativo e sem excluir os clubes desistentes da sua divulgação.
Recentemente, Gary Neville, ex-jogador do Manchester United, trouxe a informação à imprensa de que uma nova movimentação para a criação da Superliga estava em andamento. Na ocasião, Alexander Ceferin, presidente da UEFA, e Javier Tebas, presidente de La Liga, também se manifestaram, acusando os clubes resistentes de tolos e mentirosos por insistirem no caso.
Em paralelo, os três clubes se movimentaram juridicamente para se proteger de possíveis sanções. Sendo assim, a ação está prevista para ser julgada até meados de 2023 no Tribunal Europeu de Justiça. Em resumo, a ação tenta caracterizar a atuação da UEFA no futebol de clubes europeu como um monopólio. Ou seja, uma prática ilegal por regular, organizar e vender as competições, isto é, controlar todas as frentes do negócio.
Ainda que o futuro resultado desta ação não seja claro, a Superliga parece hoje um projeto inviável. Até pelo acordo assinado, é improvável que qualquer clube inglês tente novamente se envolver com o projeto. Como um vencedor desse processo, Nasser Al-Khelaifi, presidente do Paris Saint-Germain, fortaleceu seu poder. Alinhado com a UEFA, ele assumiu a presidência da ECA e se mantém um crítico da iniciativa.
Impacto na situação atual do Chelsea
Como se sabe, o Chelsea está à venda nesse momento. A invasão russa na Ucrânia levou a sanções que afastaram Abramovich dos Blues até motivar a venda do clube. Em meio ao processo de venda comandado pelo banco Raine, os torcedores azuis têm protestado contra um dos potenciais compradores: a família Ricketts. Basicamente, os protestos ocorrem por causa de posicionamentos preconceituosos de membros da família.
Entretanto, o consórcio comandado por eles aparenta estar ganhando força. De forma a combater ou amenizar estes protestos, os Ricketts emitiram no último domingo (3) uma série de compromissos assumidos por eles caso assumam o Chelsea. Em geral, os itens abordam questões sociais e financeiras a respeito do clube. Porém, um item também se destaca no que diz respeito à Super Liga:
- Jamais participar de uma Super Liga Europeia e sempre proteger a integridade e a herança do Chelsea FC.
Ou seja, os Ricketts tentam se afastar da onda anterior de protestos e de mais uma possível insatisfação da torcida com eles.
Dentro das quatro linhas
Enquanto a situação segue quente na política dos Blues, Thomas Tuchel segue com a missão de blindar o elenco. Depois da derrota pesada para o Brentford no último domingo (3) por 4-1 em casa, a expectativa é de que o time reúna as forças necessárias para enfrentar o atual líder espanhol. Como dito anteriormente, as condições conturbadas são muito similares às que rondaram o último embate entre os clubes.
Na temporada passada, os Blues despacharam o Real Madrid nas semifinais da Champions. Este será o quarto duelo das equipes em fases eliminatórias e até hoje o Chelsea prevaleceu sobre os merengues em todas as oportunidades. Enquanto a direção espanhola segue apontada para a Super Liga, a expectativa é que os Blues sigam seu rumo para o tricampeonato continental.
Dessa forma, o Chelsea recebe o Real Madrid em Stamford Bridge nesta quarta-feira (6). Às 16 horas pelo horário de Brasília, ingleses e espanhóis iniciam a disputa pela vaga nas semifinais da atual edição da Champions League.