Com sanções e novas regras, como seguirá a Academia do Chelsea?

Ao pensar nos efeitos que o Chelsea está sofrendo desde que Roman Abramovich foi sancionado grande parte dos torcedores pensa apenas nos times principais seja o masculino ou o feminino. Afinal, as equipes comandadas por Thomas Tuchel e Emma Hayes são aquelas que têm maior número de partidas transmitidas seja na Inglaterra ou mundialmente.

No entanto, o Chelsea Football Club vai muito além das equipes principais em ambas as modalidades. A Academia é um dos projetos que mais ganhou notoriedade na Era Abramovich e é um dos grandes motivos de orgulho para o clube e para a torcida também. Em outras palavras, Cobham se tornou um dos grandes centros produtores de talentos no futebol à nível global.

Então, é óbvio que essa área também sentirá os efeitos das consequências que os Blues vêm passando no momento. E não apenas efeitos que advém das sanções ao ainda proprietário do clube, mas também aqueles que virão da mudança de regras na contratação de jovens que se deram após o Brexit. Nesse sentido, para além de entender o cenário deste fim de temporada, é importante ressaltar as possibilidades para o futuro nos próximos anos.

O funcionamento da Academia

A Academia do Chelsea opera desde as equipes sub-9 até as sub-23. Porém, a “graduação” desses talentos acontece a partir dos 17 anos, quando os jogadores começam a fase de desenvolvimento profissional. Nesse sentido, os Graduates, como são chamados os jogadores que vão subindo nas categorias de base até o estágio de desenvolvimento profissional, são divididos em duas categorias: o development squad e o youth team.

Além dos jovens graduados, os Blues também contam com scouting para contratar jovens talentos de outros clubes. Assim, esses jovens também ingressam nas categorias de base e formação do Chelsea, possivelmente buscando uma chance de chegar até a equipe principal.

Vale destacar que nos últimos anos o clube vêm promovendo um movimento bastante similar para o futebol feminino. Dessa forma, a Academia está se expandindo e buscando consolidar um projeto similar com jovens jogadoras. Portanto, as categorias de base feminina serão, da mesma forma, afetadas. Com a possibilidade, até mesmo, de os efeitos serem sentidos com mais intensidade uma vez que ainda é um projeto em formação dentro do clube.

Instabilidades já eram a marca da temporada

Na última sexta-feira (11), a equipe de desenvolvimento do Chelsea enfrentou o West Ham em Londres e empatou com os Hammers em 1-1. Com isso, os Blues conquistaram apenas um ponto, um resultado bastante ruim dada a realidade da Premier League 2. No momento, o time está na vice lanterna com apenas 18 pontos em 19 jogos. Mais ainda, com apenas sete rodadas faltando para o fim do campeonato.

Além disso, a equipe sub-19 – que possui basicamente o mesmo corpo de jogadores e comissão técnica que o Development Squad (sub-23) – sofreu uma dura derrota por 5-1 para o Genk na UEFA Youth League. Assim, o Chelsea, que é bicampeão da competição, foi eliminado ainda na fase de play-offs.

Diferentemente das outras equipes, o time sub-18 faz boa temporada tanto no campeonato nacional da categoria como na copa da liga. No último sábado (13), conquistaram a vaga na final da Copa da Premier League sub-18 depois de derrotarem o Stoke City por 5-1. Mais ainda, ocupam a quarta colocação da divisão sul da Premier League sub-18, com 35 pontos conquistados em 17 partidas jogadas. Dessa forma, o time segue na disputa pelo título.

Apesar da boa performance do sub-18, é preciso destacar esta temporada negativamente. Principalmente pelo nível alto que a Academia do Chelsea apresentou nos últimos anos.

Processo longo que colhe seus frutos

Juntamente com Abramovich, pelos investimentos que promoveu fez na categoria, uma das grandes figuras responsáveis pelo processo de desenvolvimentos de jovens no Chelsea é Neil Bath.

Cerca de uma década antes de o russo comprar o clube, Bath já fazia parte da comissão técnica das categorias de base Blue. Em 2002, ele foi apontado como diretor assistente da base e, desde então, subiu na hierarquia da Academia. Por fim, em 2011, assumiu a função de Head of Youth Development. Portanto, se tornando o supervisor da organização dos times da base – com destaque para a equipe sub-23.

Como resultado, Cobham acumula títulos importantes:

  • 2 Premier League 2 (antes U-21 Premier League) – 2013/14 e 2019/20
  • Under 18 Premier League – 2016/17 e 2017/18
  • FA Youth Cup – 2010, 2012, 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018
  • UEFA Youth League – 2014/15 e 2015/16

Mais ainda, a base foi a grande salvação do clube diante da impossibilidade do clube de contratar durante a temporada 2019/20. Logo, é possível dizer que os frutos do desenvolvimento do projeto de formação de talentos do clube são colhidos para além dos anos nos quais os jogadores estão no programa. Isso porque muitos desses jogadores passaram a integrar o elenco principal. E, por outro lado, muitos jogadores foram negociados e garantiram um retorno financeiro ao Chelsea.

Longe de uma crise, mas em alerta

No início da temporada, algumas peças importantes do development squad deixaram o Chelsea em busca de chances em equipes principais. Como foi o caso de Lewis Bate, Myles Peart-Harris e Tino Livramento. Dessa forma, já existia a exigência de adaptação do coletivo com as ausências. Além disso, por conta das lesões e dos casos de covid, alguns jogadores dos times de desenvolvimento integraram o elenco de Thomas Tuchel. Como resultado, não puderam atuar pelos jogos das competições da base.

Aos 17 anos, Lewis Hall debutou no time principal no confronto contra o Chesterfield na FA Cup (Créditos: IMAGO / PRiME Media Images)

Apesar de tudo, é lógico, que os jogadores e as comissões técnicas buscam acumular resultados e ganhar quantos troféus possíveis. Mas o grande propósito de toda a estruturação da Academia é o desenvolvimento individual dos jogadores. Por isso, não é nada fora do comum que alguns dos jovens estejam debutando em categorias acima de suas idades.

Logo, mesmo com os altos e baixos, Cobham segue com gana para crescer e florescer ainda mais no futuro. De acordo com o The Athletic, já existe um projeto visando o ano de 2030. Em outras palavras, que está visualizando o potencial de crescimento das atuais categorias sub-11 e sub-12, que vêm conquistando títulos no futebol nacional que, em 2030, estarão jogando entre o sub-18 e o sub-23 e poderão vir a se tornar adições ao time principal.

De olho num futuro mais imediato

2030 ainda está distante. Por isso, o clube precisa consolidar, também, projetos e planos que impactem mais rapidamente. Antes das sanções a Abramovich, os Blues reforçaram seu scouting na Inglaterra, ampliando a busca por jovens que estavam atuando nas categorias de base de outros times.

Logo, duas contratações já foram feitas para reforçar a equipe de desenvolvimento. O lateral Dylan Williams chegou do Derby County na última janela e assinou um contrato até 2025. Ainda no verão, o Chelsea contratou o atacante Mason Burstow junto ao Charlton Athletic. Porém, Burstow seguirá em empréstimo no próprio Charlton até o fim desta temporada e só irá atuar com a camisa azul a partir de 2022/23.

A última movimentação dos Blues para reforçar as categorias de base foi a contratação de Leo Cardoso, que trocou o West Bromwich pelos londrinos. O jovem português tem apenas 15 anos e é considerado um dos melhores da sua categoria. Dessa forma, pode representar um passo intermediário entre o futuro próximo e o projeto que visa 2030.

Cardoso posa com John Terry e Petr Cech após assinar com o Chelsea (Reprodução: Leo Cardoso/Instagram)

Com as sanções, no entanto, o trabalho de scouting do clube teve que ser paralisado. Sendo assim, fica difícil saber quando os scouts retomarão suas funções e, acima de tudo, quando o Chelsea poderá contratar novamente.

Recrutamento restrito

Desde a saída do Reino Unido da União Europeia, os clubes britânicos não tem permissão para contratar jogadores jovens de países das categorias do sub-16 ao sub-18 que ainda fazem parte do bloco europeu. Fora que, mesmo após ter 18 anos completos, eventuais contratações pelos clubes britânicos devem respeitar uma série de critérios da Football Association.

Sim, essa regra vale desde 2020. Em outras palavras, antecede (e muito) todo o contexto atual pelo qual os Blues passam. Contudo, representa mais uma barreira para fortalecimento da base.

Ainda mais olhando para o passado: o Chelsea se deu muito bem com contratações de jovens jogadores de outros países como foi o caso de Andreas Christensen, que segue no clube, e Nathan Ake, que agora joga no Manchester City. Em tempos mais recentes, o zagueiro holandês Xavier Mbuyamba e o goleiro finlandês Lucas Bergström chegaram para integrar o development squad.

Em suma, percebe-se que o scouting fora da Inglaterra trouxe nomes importantes para o clube. Alguns deles que se consolidaram e seguiram caminhos diferentes em suas carreiras mas que, de qualquer forma, tiveram sucesso após serem formados em Cobham. Logo, o mercado está reduzido e o recrutamento se torna muito mais difícil, uma vez que muitos clubes estão restritos a um mesmo mercado – e de fato entrarão em disputas por mesmos nomes.

Enfim, uma alternativa que o clube encontrou é a observação de times que não atuam nas quatro principais divisões da Inglaterra. Nesse sentido, um destaque dessa nova movimentação do clube londrino é o atacante Jayden Wareham, que chegou do Woking na última temporada.

Em 26 partidas como Blue, Jayden tem seis gols e duas assistências (Reprodução: Getty Images)

O que esperar daqui para frente?

As mudanças nas regras de contratações de jovens jogadores obrigou o Chelsea reinventar seu modelo de recrutamento. E, por consequência, da estruturação da sua Academia. Sem dúvidas, esse tipo de coisa acontece e é importante que o clube consiga se adaptar para não abrir mão ou deixar abaixar o nível de um centro de treinamento e desenvolvimento que é um dos melhores do mundo.

Em especial com os milhões de libras que Abramovich investiu na estrutura de Cobham e nos projetos das categorias de base foram essenciais para dar o pontapé inicial. No sentido de que por toda a estrutura que os Blues apresentam, se torna muito menos complicado convencer jogadores (e em muitos casos os pais desses jovens) a se juntarem ao clube.

No momento, os londrinos não podem contratar, mas com certeza já tinham alguns alvos. Ou seja, outros clubes podem acabar tomando alguns dos interesses dos Blues e contratar jogadores que estavam no radar dos olheiros da equipe. Principalmente se a impossibilidade de contratar novos nomes seguir por mais tempo.

Porém, ao que tudo indica, uma vez vendido, o Chelsea poderá retomar suas atividades normalmente. Assim, levando o foco para uma outra questão: o novo proprietário estará disposto a seguir investindo forte e de forma recorrente na Academia?

Sim

Essa deve ser a única resposta possível. A Academia, a cada temporada, se mostra ainda mais importante para o clube como um todo. E não somente pela formação de talentos que contribuem dentro de campo. Como também pela formação de laços entre os jogadores formados no clube e o próprio Chelsea.

Jogadores como Mason Mount e Reece James são a grande prova disso. Ambos se desenvolveram desde muito novos junto aos Blues e fazem parte da grande geração vencedora da última década. Muito além de suas capacidades no futebol, os dois se mostram muito conectados ao Chelsea e entendem muito a cultura do clube. Mais ainda, reproduzem essa cultura dentro e fora de campo.

Sendo assim, quem quer que seja o novo dono deve reforçar esse compromisso com a formação de talentos pelo clube. Assim como, em última instância, com a torcida – que apoia o projeto e deseja que ele siga dando frutos. O que se iniciou antes da Era Abramovich e cresceu de forma exponencial sob o comando do russo não pode ter seu nível reduzido de forma alguma.

O momento atual está longe do ideal para as equipes de Cobham. Mas nada está perdido e o quanto antes as questões pendentes forem resolvidas melhor. Muito menos significa um fracasso do projeto. Em outras palavras, a estrutura permanece, seja ela física ou na organização dos cargos e funções dos funcionários, e muitos jogadores tem interesse em se juntar ao clube – nos mais diversos grupos de idade.

Pode ser que esse ano acabe sem um título importante para qualquer das equipes de desenvolvimento profissional. No entanto, caso aconteça, será uma temporada atípica por tudo que aconteceu até agora. Que com o novo proprietário venha o mesmo sentimento de que a Academia é essencial para o clube nos mais diferentes cenários.

Category: Chelsea Football Club

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Article by: Nathalia Tavares