A mudança de atitude de Cesc Fàbregas

Pouco se conhecia sobre o então jovem de 16 anos Francesc Fàbregas quando se juntou ao Arsenal vindo das categorias de base do Barcelona em 2003. Ainda muito novo, não demorou muito tempo para se adaptar ao futebol inglês e aproveitou bem as suas chances cobrindo espaços deixados por lesões eventuais dos então titulares Patrick Vieira e Gilberto Silva. Porém, foi só depois da aposentadoria do volante francês que Fàbregas herdou a camisa 4 do time inglês e começou sua trajetória pelos gramados da Inglaterra.

Fàbregas (esq.) ao chegar em Londres com apenas 16 anos (Reprodução Site Oficial Arsenal)
Fàbregas (esq.) ao chegar em Londres com apenas 16 anos (Reprodução Site Oficial Arsenal)

Apesar de ter tido Vieira como mentor no início de carreira, Cesc desenvolveu seu próprio estilo de jogo que ficou marcado pelo bom controle de bola, passes precisos e imposição de ritmo no meio campo. Mesmo com baixa idade e pouca experiência ele conseguiu desenvolver seu potencial e foi indicado ao prêmio de Melhor Jogador do Ano e Melhor Jogador Jovem do Ano no campeonato inglês sendo preterido pelo então jogador do Manchester United Cristiano Ronaldo.

Foi só depois da saída de Thierry Henry para o Barcelona que Fàbregas tomou as rédeas do time inclusive envergando a faixa de capitão. Ao longo de oito temporadas pelo Arsenal, o espanhol notabilizou-se pela grande quantidade de assistências, pela liderança dentro de campo, mas também por demonstrar falta de disposição em determinados momentos e se omitir em alguns jogos. Apesar de algumas críticas sobre suas duas últimas temporadas em Londres e depois de algumas tentativas de contratação pelo Barcelona, Fàbregas voltou a sua equipe de formação em 2011 para ser comandado pelo seu ídolo de infância Pep Guardiola.

Fàbregas foi capitão dos Gunners nos últimos anos de sua primeira passagem por Londres (Foto: Getty)
Fàbregas foi capitão dos Gunners nos últimos anos de sua primeira passagem por Londres (Foto: Getty)

No Barcelona, Cesc entrou num esquema diferente do que estava acostumado no Arsenal. Apesar de utilizar a mesma numeração e ainda ser considerado um meio campo central e cerebral, a sua participação ficou ofuscada por um time que era organizado por Xavi e Iniesta no meio campo e que tinha Lionel Messi como grande estrela e protagonista. Mesmo nos últimos cinco anos de Arsenal tendo criado mais chances de gol e dado mais assistências que os novos companheiros de meio campo, o jogador outrora cerebral não desempenhou a mesma função nos Blaugranas. Em vez disso, por muitas vezes, foi adiantado para o ataque para executar a função criada por Guardiola, a de “falso nove”. Mesmo sendo menos genial e agora coadjuvante, em seu primeiro ano de Barcelona, ele ganhou vários prêmios de melhor meio campista, além de distribuir 20 assistências e assinalar 15 gols em 48 participações.

Barcelona's midfielder Cesc Fabregas reacts during the Spanish league football match Elche CF vs FC Barcelona at the Martinez Valero stadium in Elche on May 11, 2014. AFP PHOTO/ JOSE JORDAN (Photo credit should read JOSE JORDAN/AFP/Getty Images)
Cesc não conseguiu repetir o bom futebol apresentado pelo Arsenal na sua passagem pelo Barcelona

Apesar do seu sucesso nos números e nos prêmios que acumulara durante sua carreira, inclusive uma Copa do Mundo pela Seleção Espanhola em 2010, Fàbregas ainda era muito marcado pelo seu comportamento em campo que, muitas vezes, beirava o descaso. Ao longo de sua carreira, o estímulo de buscar o time titular, a vontade de mostrar serviço para os treinadores e a capacidade de inflamar os companheiros parecia estar diminuindo. Foi buscando novos ares que o espanhol acertou a sua vinda para os azuis de Londres, a pedido do muitas vezes rival José Mourinho, que então era técnico dos Blues.

Após três temporadas no clube catalão, Fàbregas chegou em Cobham com status de estrela e organizador do meio campo que sempre foi. Contratado por 33 milhões de euros, o ex-Arsenal agora chegaria para ser titular no time de Mourinho que almejava por voos mais altos como o título da Premier League. Conquistando o título em sua primeira temporada de volta à Inglaterra, Cesc foi fundamental para o funcionamento do time campeão com 18 assistências só no campeonato nacional, marca só superada pelo próprio Fàbregas em temporada na passagem pelo Arsenal.

Apesar da sua importância nos Blues ele fez, assim como todo o time, uma temporada seguinte muito abaixo de suas características, acentuando o seu defeito da omissão e diminuindo a sua capacidade de criação. É seguro dizer que foi a pior temporada da carreira do espanhol, pelo menos em números e boa parte da demissão do técnico José Mourinho deveu-se à falta da organização que Fàbregas proporcionava dentro de campo rendendo inúmeras derrotas.

O espanhol liderou os Blues na conquista do título inglês da temporada 14-15
O espanhol liderou os Blues na conquista do título inglês da temporada 14-15

Após passagem de Guus Hiddink, como interino no final da temporada 15-16, esperava-se que Cesc reencontrasse seu bom futebol e aumentasse as suas participações como titular com o novo técnico contratado Antonio Conte. O que aconteceu foi exatamente o inverso, pelo menos no que se refere à titularidade indiscutível do meia espanhol. O técnico italiano chegou e mostrou que se Fàbregas quiser jogar, vai ter que demonstrar comprometimento e vontade em campo, coisa que não se via no jogador  a algumas temporadas. Portanto, o camisa 4 dos Blues começou a temporada como opção no banco de reservas, preterido em favor dos companheiros Oscar e Nemanja Matic e do novo contratado N’golo Kanté. O jogador admitiu em entrevista a dificuldade de estar em uma situação adversa em sua carreira:

“É uma situação nova para mim na minha carreira – após 13 anos de jogar basicamente tudo pelos meus clubes e minha seleção. Tem sido difícil. Não vou negar, mas a última coisa que farei é reclamar ou desistir.”

“Algo dentro de mim está saindo mais forte que nunca e eu me sinto como um garotinho no treinamento tentando reconquistar meu lugar como fazia no Arsenal quando tinha 16 anos. Espero que possa conseguir novamente”

Pelo menos para o espanhol de 29 anos alguma coisa mudou na sua atitude ficando no banco de reservas. Jogando apenas poucos minutos nas partidas que atuou, ele demonstrou um aumento significativo na média por 90 minutos de seus atributos defensivos. Apesar do número de interceptações e bloqueios ter subido, os números mais importantes são a pontuação defensiva, que já não é mais negativa e o percentual de engajamentos em duelos que passou da casa dos 40% para a casa dos 60%, ou seja, o meio campista está se envolvendo em mais disputas de bola e, o que é mais importante, vencendo-as.

Os dados mostram um Fàbregas mais atento e combativo, ao estilo de Conte (Reprodução Squawka)
Os dados mostram um Fàbregas mais atento e combativo, ao estilo de Conte (Reprodução Squawka)

Antonio Conte fez uma declaração em que espera que o espanhol seja um jogador mais completo e equilibrado no que diz respeito à recomposição defensiva para que possa ganhar de volta seu lugar como titular do clube. Entretanto, devido às várias boas atuações entrando somente nos minutos finais e mudando o panorama da partida, é uma grande dúvida para o técnico italiano a permanência de Cesc no banco de reservas.

“Eu quero vencer e minha escolha é feita para vencer. Eu não me importo qual é o nome do jogador. Para mim é importante quando eu chamo alguém para jogar e eles prova que a minha escolha não estava errada”, disse o italiano.

Foi o que aconteceu na última terça-feira (20/09) em partida válida pela Copa da Liga Inglesa, em que Fàbregas marcou os dois gols da classificação do Chelsea por 4-2 na prorrogação, fazendo o time inglês avançar para a próxima fase da competição.

Leia Mais: Defesa falha, mas Chelsea vira e avança na Copa da Liga Inglesa

Não há dúvidas da capacidade técnica de Fàbregas e da sua habilidade em desequilibrar uma partida com um gol ou uma assistência. O necessário agora é o espanhol demonstrar a maturidade que vem demonstrando, aceitar ficar, à princípio, como opção no banco de reservas e continuar tentando mostrar em campo que merece estar em todos os jogos do Chelsea, provar que pode fazer o papel que Conte quer que ele faça dentro do time e, mais importante, acender o fogo daquele jovem atleta de 16 anos que lutava arduamente para recuperar um espaço que no fundo sempre foi seu.

Category: Chelsea Football Club

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Article by: Lucas Jensen

Jornalista que ainda acredita que o futebol pode ser apreciado sem torcer (mas não se segura e torce mesmo assim). Fã de tática e do jogo reativo, se deleita nos contra-ataques e toques 'de primeira'. Amante racional da Premier League e nostálgico do Calcio, seus hobbies incluem teorias mirabolantes e soluções inusitadas.