
O Arsenal da segunda metade da temporada passada ficou conhecido pelo bom futebol jogado, com trocas de passes rápidas, movimentação dos jogadores de frente e por um estilo mais ofensivo, que se sustentava num esquema tático com apenas um volante, Francis Coquelin, que se notabiliza por ter boa saída de bola.
Para compensar a ausência numérica na marcação no meio de campo, Arsène Wenger implementou uma marcação avançada, ainda no campo de defesa do adversário, sob pressão e com todos os jogadores de ataque preenchendo os espaços assim que perdiam a bola para tentar evitar uma saída de bola bem construída do adversário. Este sistema de marcação está em alta nos últimos anos, desde que Pep Guardiola o ressuscitou no Barcelona.
Apesar do bom futebol da segunda metade da temporada, a primeira havia sido inconsistente, contrapondo o equilíbrio e regularidade do Chelsea, que levou a Premier League com todos os méritos possíveis.
Um dos grandes antagonistas deste sistema de jogo adotado pelo Arsenal é exatamente José Mourinho, que desde os embates com o Barcelona de Guardiola com a sua Inter de Milão sabe muito bem como armar times para jogar com equipes que marcam e atacam como o atual Arsenal faz.
O primeiro passo é defender com superioridade numérica. Normalmente duas linhas de quatro, mas ainda com mais um jogador entre essas linhas, no caso Nemanja Matic, flutuando entre elas para que sempre haja uma defesa com quatro ou cinco jogadores atrás da bola. Uma vez o sistema defensivo ajustado, é hora de sair jogando e para enfrentar equipes que marcam em cima, o melhor artifício é tentar romper as linhas altas de marcação com poucos passes incisivos e velocidade.
E foi exatamente o que Mourinho tinha em mente ao escalar Ramires como titular. Ao retirar um armador, no caso Oscar, para jogar Ramires desde o início, Mourinho abria mão do 4-2-3-1 habitual para jogar em um 4-3-2-1 com um time mais recuado. Três volantes: Matic, Ramires e Fàbregas. Um marcador, um corredor e um passador, respectivamente. Era a estratégia de Mourinho para romper a marcação alta de Wenger.
Sem a bola, o time faria uma linha quatro marcadores com os dois zagueiros e os laterais. Pouco a frente deles estava Matic e, logo em seguida, outra linha de quatro marcadores, com Ramires, Fàbregas, Willian e Hazard, com Remy flutuando para o lado onde a bola estava para preencher o espaço entre os armadores e zagueiros do Arsenal.
Uma vez recuperada a bola, haveria uma tentativa de sair em velocidade para pegar a defesa adiantada do Arsenal desprevenida, aproveitar a marcação alta no campo de ataque do Chelsea. Bola para Fàbregas ou Willian, que acionariam Ramires e Hazard em velocidade. Toques rápidos e velocidade.
Na temporada passada funcionou, com o Chelsea arrancando um empate morno, sem correr riscos, em abril no Emirates, resultado que praticamente garantiu o título dos Blues. Foi o que o Mourinho pensou e quis repetir, mas não deu certo.

Pela primeira vez na história do confronto Mourinho x Wenger, o francês foi mais inteligente. Ele deu um nó tático no português e, aprendendo com os confrontos das temporadas passadas, conseguiu neutralizar o plano de jogo que Mou costuma utilizar em grandes jogos.
Primeiro ao escalar a equipe com apenas um jogador fazendo o papel de volante e sem um centroavante. Wenger deu a impressão de que utilizaria o mesmo sistema de jogo e marcação, dando a Mourinho a ilusão para que ele colocasse em prática o plano descrito acima. Todos realmente acreditaram que o Arsenal faria o seu jogo de sempre, mas foi aí que Wenger soube o que fazer.
Apesar da equipe ofensiva em campo, Wenger adotou uma outra tática. Uma tática mais próxima da de José Mourinho. Ele anulou todo o plano de jogo do português. O Arsenal realmente jogava avançado, tentando trocas de passes e controle de bola, que não dava tão certo assim pela forte marcação dos Blues. Mas o diferencial foi que, quando o Chelsea roubava a bola, ao invés de adiantar a marcação e possibilitar as saídas rápidas de Ramires e Hazard e as enfiadas de Fàbregas e Willian, o Arsenal recuava gradativamente, dando ao Chelsea a bola para trabalhar, forçando a lentidão dos Blues.
E aí foi o nó. Com o Arsenal esperando o Chelsea no campo de defesa para marcar, o Chelsea precisaria de um jogo de paciência, de armar jogadas e de furar a defesa vermelha. Só que a equipe em campo não foi programada para isso, não era esse o plano de jogo. O Arsenal recuava sem a bola e impedia o Chelsea de jogar no contra-ataque rápido. Os comandados de José Mourinho tinham de construir as jogadas lentamente, com paciência, e para isso um volante a mais em campo e a ausência de um armador central foi determinante para que o time não conseguisse jogar.
O resultado foi um futebol lento e desorganizado, principalmente no segundo tempo. O sistema pensado por Mourinho tinha jogadores abertos pelos lados, e volantes prostrados no centro, para alimentar as saídas pelas laterais, que culminariam com cruzamentos e infiltrações para Remy e Ramires ou Hazard, pendendo do lado em que o ataque estaria, que se posicionariam pelo centro. Com a estratégia planejada, não era preciso um jogador pelo centro da armação, um camisa 10.
Porém, com a defesa do Arsenal postada e uma linha de quatro e outra de cinco jogadores, jogar pelos lados não fazia sentido, tampouco a alternativa da velocidade. Era preciso passes decisivos e pensadores do jogo. Claro que temos Fàbregas em campo para isso, mas uma vez que ele foi anulado, não havia muito para o Arsenal se preocupar. Até porque sabemos que ele rende melhor armando a partir da defesa e em transição, e não colado na área adversária.

E isto foi tão verdade que Hazard e Remy ficaram isolados, sem serem alimentados; e Ramires por mais que tentasse se colocar na ponta direita, não podia usufruir de suas principais características e como último passador ele não teve muita utilidade. Quando Hazard voltava pra suprir a ausência de alguém que buscasse a bola, faltava poderio na frente, deixando Remy ainda mais sozinho. Com Willian foi a mesma coisa: o brasileiro voltava para trocar passes com o meio, mas a falta de companhia sobrecarregou o meia e deixou espaços vazios no ataque.
Mais que isso, o Chelsea teve todo um preparo antes da partida para executar um plano de jogo, que deu certo contra o Manchester United na temporada passada, por exemplo. O time estava programado para contra ataques e para enfrentar um time ofensivo. Mas uma vez que não havia espaço e possibilidade para fazer o jogo do contragolpes rápidos, o time se perdeu e visivelmente parecia sem uma estratégia para encarar a situação de jogo não pensada.
E foi exatamente por ter que ocupar o campo de ataque com paciência que o Chelsea tomou um gol em transição. Os Blues estavam prontos para defender postados e não recebendo contra ataques. O Arsenal foi quem estacionou o ônibus, em certo grau, e teve a mesma precisão que os times de José Mourinho, que matam o jogo em uma bola. O time de Wenger contra-atacou e pegou a defesa azul desprevenida.

No segundo tempo, Mourinho tentou corrigir o sistema de jogo, mas o Arsenal se defendeu ainda mais, colocando mais um volante em campo e teve chances para fazer um segundo e terceiro gols. O time melhorou com a entrada de Oscar na armação, mas, restando apenas 35 minutos de jogo, o time não soube se adaptar à partida, talvez não tenha sido preparado para esta variação de jogo, que ninguém havia previsto, nem mesmo Mourinho.
Ficou visível com a entrada de Oscar que escalar um time com apenas dois volantes e três ligadores teria sido a melhor alternativa, já que haveria mais qualidade para romper linhas defensivas bem colocadas. Haveria a possibilidade da triangulação que Oscar permite ao se aproximar dos outros jogadores, com passes curtos.
E quando o time crescia um pouco mais em campo, restava poucos minutos no relógio e Mourinho preferiu o desespero a organização e o time terminou a partida sem um esquema em campo, com três zagueiros, dois volantes, quatro armadores e um atacante. Um time que lendo assim parece ofensivo, mas na verdade nem um time era, e sim apenas um conjunto de jogadores.
A partida não é um prelúdio da temporada e a possibilidade de irmos longe na campanha 2015/2016 é imensa, ainda mais com os reforços que devem chegar, prioritariamente para a zaga, apesar de ficar nítido a necessidade de mais um armador para o time. Mas a verdade é que Wenger mostrou aos grandes times um caminho para anular o Chelsea e isso é perigoso.
Em grandes partidas, contra fortes adversários, Mourinho sempre prefere um esquema com três volantes, uma estratégia de precaução para vencer o adversário em contra ataques, e o Arsenal no domingo trouxe o antídoto perfeito para esta formação, para a “retranca” de Mourinho. Talvez seja o momento de Mourinho repensar esta estratégia e passar a encarar grandes times de igual para igual, muito pela qualidade que temos no elenco, mas principalmente porque, nesta temporada, o principal objetivo é ir longe na Champions League.