Análise Tática: A previsibilidade tática e o mau momento dos pilares do Chelsea

Sistema tático defasado e mau momento de alguns jogadors, como Ivanovic e Fàbregas, tem sido decisivos para o mau momento do Chelsea
Sistema tático defasado e mau momento de alguns jogadores, como Ivanovic e Fàbregas, têm sido decisivos para o mau momento do Chelsea (Foto: Getty Images)

O Chelsea que iniciou a temporada 2014/2015 era uma máquina, com Diego Costa marcando sete gols nos primeiros quatro jogos e Fàbregas jogando o “fino da bola” e ditando o ritmo de um time que encantava e fazia brilhar os olhos de nós torcedores azuis. A seu lado, outro pilar, Nemanja Matic, fazia seu papel com maestria e firmeza, marcava implacavelmente e ajudava na transição com qualidade. Nas laterais, Ivanovic e Azpi cumpriam muito bem seus papeis defensivos e o sérvio até mesmo subia ao ataque para marcar seus golzinhos.

O meio, com Oscar, Willian e Hazard, se dava muito bem com o novo centroavante e distribuía o jogo, com movimentação, transição e ajuda na marcação. Nos segundos tempos, e até mesmo começando jogos, tínhamos Schürrle e Ramires, para mudar a cara do jogo, com ocorreu, por exemplo, com o brasileiro no 6-3 sobre o Everton, na terceira rodada da última temporada.

Era um time avassalador. E por um motivo mais que óbvio: era um time imprevisível. Diego Costa e Fàbregas eram os novos centros do time e ninguém na Premier League estava preparado para lidar com eles em tão bons momentos. Os meias se movimentavam, os laterias apareciam como surpresas e até mesmo os volantes apareciam na entrada da área para prover assistências e triangulações, o que aumentava o leque de jogadas ofensivas, pois havia sempre alguém para receber a bola ou puxar a marcação, criando espaços nas defesas adversárias.

O único ponto previsível daquele time era a defesa: nunca falhava. Entrava e saía jogo e a defesa se mantinha sólida com Terry e Cahill (ou Zouma ali no meio da temporada). Tínhamos uma zaga de respeito. Não atoa fomos a melhor defesa da Premier League, com 32 gols sofridos em 38 partidas. E o segundo melhor ataque: 73 tentos marcados.

Hoje o quadro é outro: 17 gols sofridos em oito partidas. Sofremos em oito jornadas mais da metade dos gols que sofremos em 38 partidas. Fomos tomar o 17º gol da Premier League passada na 20ª rodada. Vigésima. E contra o Tottenham, naquele 5-3 sofrido, com grande atuação de Harry Kane.

Era o primeiro jogo de 2015. Derrota humilhante para um rival, 5-3. Partida com maior número de gols tomados por José Mourinho na Premier League. Naquela rodada nos mantivemos na primeira posição da tabela apenas por questão alfabética. Era um sinal de que os adversários já sabiam como lidar com nosso futebol. E era o começo da queda de rendimento de alguns jogadores importantes, como Cesc Fàbregas, Branislav Ivanovic e Diego Costa, que fizeram uma primeira metade de temporada fantástica, mas que não conseguiram manter o mesmo desempenho na segunda. Principalmente Cesc, que foi de 15 assistências na primeira metade do inglesão para apenas três na segunda.

Foi ali, naquele período do ano, o começo do declínio técnico e tático do time de José Mourinho. Ivanovic, por exemplo, já demonstrava sinais de cansaço e falhas táticas naquele momento. Mas sua presença ofensiva e a solidez defensiva do time mascaravam isso de certa forma. Porém agora, com outros jogadores em mau momento, falhas individuais ficam ainda mais evidentes.

Ivanovic deixando o lado de defesa do Chelsea desguarnecido contra o Tottenham, no primeiro jogo de 2015. Esta falha se tornou recorrente. (Foto: Sky Sports)
Ivanovic deixando o lado de defesa do Chelsea desguarnecido contra o Tottenham, no primeiro jogo de 2015. Esta falha se tornou recorrente nesta temporada. (Foto: Sky Sports)

A partir da segunda metade da temporada passada o Chelsea passou de um time que encantava para um time pragmático. Tanto que terminamos abril discutindo o ônibus de José Mourinho contra Arsenal e Manchester United. E até mesmo contra times pequenos passamos a jogar um futebol econômico. Foi necessário e o suficiente para manter a liderança e garantir o título da Premier League.

Essa queda de rendimento já tinha sido dissecada com muito mais detalhes pelo meu parceiro Cleisson Lima em uma outra análise tática.

Mas foi o sinal de que o time precisaria de mudanças táticas, de variantes para o decorrer das partidas ou até mesmo para encarar adversários diferentes em condições táticas diferentes. Ali foi o alerta de que o Chelsea deveria ir ao mercado e trazer peças para integrar o elenco, alternativas aos jogadores que temos hoje no time titular.

Porém a temporada 2015/2016 começou e olhamos para o elenco apenas para enxergas as mesmas peças e mais do que isso, a mesma maneira previsível de se jogar. Seria melhor ter peças que possam dar variações de jogo diferentes (como Schürrle, que dava um contraponto a Oscar e Willian), mas é evidente que é possível se adaptar taticamente dentro de um mesmo elenco, criar alternativas e variações com o que se tem, até porque os Blues não têm um elenco ruim. Mas nem isso Mourinho fez e o Chelsea foi a campo com o mesmo sistema de jogo da última temporada.

E para piorar o sistema que já era previsível em meados da temporada passada passou a contar com seus pilares em momentos ruins. No mesmo sentido, deixando o time ainda pior, mesmo em péssimos momentos, eles são mantidos no time.

O Chelsea joga desde a volta de José Mourinho em um 4-2-3-1, com um centroavante de referência e três meias criativos e que participam sempre do sistema defensivo, principalmente Oscar e Willian. Dois laterais com características defensivas, sendo um deles um zagueiro de origem. E dois zagueiros seguros, firmes e sem muita invenção técnica.

O que mudou do time sem títulos de 2013/2014 para o campeão de 2014/2015 foram os volantes e o centroavante. Diego Costa, Remy e Drogba foram, por motivos óbvios, superiores a Torres, Ba e Eto’o. Mas o que fez mesmo a diferença foi a transição defesa-ataque. Mais especificamente, o segundo volante.

Em 2013/2014 normalmente se tinha dois volantes com mais características defensivas, como Matic e Mikel ou David Luiz, que jogou em muitas oportunidades ali. E Lampard, quando jogava, já não tinha o mesmo vigor físico para ser o “box-to-box” de outros tempos, tanto que muitas vezes era escalado com a ajuda de Ramires ou Mikel em campo. E o próprio brasileiro é mais a quem vai se passar a bola na transição do que aquele de quem vai partir o passe.

A chegada de Fàbregas deu isso ao time. A transição, o passe, a saída de bola. Oscar e Willian não precisavam mais recuar tanto para ir buscar o jogo, deixando o setor ofensivo esvaziado. Fàbregas fazia isso, era o motor, o maestro do time, abastecia os meias e até mesmo o atacante, com sua visão brilhante de jogo.

Porém o futebol do espanhol caiu consideravelmente e com isso a transição de jogo ficou abalada, prejudicada. Se num bom momento do Chelsea marcar Fàbregas era uma boa alternativa para anular o futebol azul, hoje com ele em mau momento torna ainda tudo mais fácil. Marque Cesc e os Blues não conseguem jogar.

Muito porque o 4-2-3-1 necessita da transição feita pelos volantes, para que a bola chegue aos meias em condições numéricas de um ataque que possibilite triangulação e aproximação dos homens de frente. Este sistema foi pensado para isso, para preencher espaços ofensivos e sem uma boa saída de bola dos volantes ele não funciona, por dois motivos: ou porque se cria um vazio entre defesa e ataque; ou porque os meias têm que recuar demais para buscar jogo, gerando um posicionamento pobre no setor ofensivo. Trabalharemos isso mais adiante.

Se Fàbregas caiu de rendimento, Matic, que sempre foi regular vestindo azul, passou também a oscilar. Com isso, a transição defensiva praticamente deixou de existir durante as partidas. Oscar e Willian, quando estão em campo, até voltam bastante para tentar buscar o jogo e para ajudar na marcação fraca que os volantes têm feito nesta temporada, mas, com isso, o sistema ofensivo fica esvaziado e ineficiente, pois o time fica desequilibrado.

Fàbregas, que já não era um primor na marcação na temporada passada, passou a ser nulo neste fundamento, e o mau momento, até mesmo físico, de Matic, fez com que a defesa do Chelsea ficasse muito exposta pelo meio. Os meias até ajudam, mas quando cumprem espaços de marcação pelo centro, acabam deixando o lado de campo mais exposto. E aí nasce a chamada “Avenida Ivanovic”, que para muitos já é mesmo uma rodovia.

E não é culpa da falta de cobertura de um meia pelo setor. É do próprio desempenho do sérvio, vice-capitão do elenco com as saídas de Cech e Drogba. Ivanovic é zagueiro de origem, portanto, suas principais armas são a marcação, a recomposição e o posicionamento. Contudo, nesta temporada, o lateral tem deixado um buraco no lado direito de defesa azul, por onde os adversários costumam criar as principais tramas ofensivas. Percebendo o momento de Iva, temos recebido muitas investidas pelo setor e, infelizmente, tem dado certo. O Chelsea toma gols por ali o tempo todo.

Cada vez mais Ivanovic tem demonstrado um grave erro de posicionamento, ao se aproximar em excesso aos zagueiros em momentos de ataque dos adversários, e com isso, deixando espaço para que a bola possa ser trabalhada em seu setor. E quando o Chelsea é atacado em transição, o defensor tem tido dificuldades de recomposição, deixando a última linha de marcação desfalcada de uma peça importante. A troca de passes no setor esquerdo dos adversários tem feito com que rapidamente Iva receba bola pelas costas e, sem vigor para recompor com rapidez, um dos zagueiros ou volantes acaba tendo que sair para o combate, deixando a zaga desguarnecida e com buracos. Muitas vezes os zagueiros acabam enfrentando adversários em um-contra-um desnecessários.

Ivanovic tem deixado espaços na marcação, por onde jogam os adversários (Imagem: This11.com)
Ivanovic tem deixado espaços na marcação, por onde jogam os adversários (Imagem: This11.com)

Outro fator tático que vem minando a temporada do Chelsea é a previsibilidade ofensiva do time. Não se enganem: Oscar, Willian e Hazard são bons nomes, senão ótimos, mas jogar sempre com os mesmos meias ofensivos acaba por ajudar a marcação adversária, que trabalha durante a semana um sistema de marcação e o executa durante a partida sem muitos problemas. Seria preciso rotação no setor, mas já há dois anos jogamos com os mesmos três meias e isso tem prejudicado muito a criatividade no setor, seja por cansaço ou fácil encaixe das marcações adversárias.

E um problema ainda maior nesta temporada é a previsibilidade de movimentação e posicionamento destas três peças. O sistema com três armadores à frente dos volantes funciona muito bem quando eles trocam de posição, se movimentam, puxam a marcação e com isso abrem espaços. Contudo, nossos meias guardam posição, e parece muito por decisão técnica de Mourinho, que determina posicionamento pelos deveres defensivos a que são incumbidos os meias.

Hazard ajuda Azpi na marcação. Willian ajuda Iva. Oscar volta e recompõe com os volantes. E a própria necessidade de estar por aquele setor defensivamente tem feito com que os jogadores não se movimentem, não troquem de posição, já que ficam demasiadamente preocupados em como se comportar quando o Chelsea perder a bola.

Aqui não faço crítica aos meias que marcam, como muitos brasileiros, pelo contrário, acredito nisto como uma premissa básica do futebol atual.

Contudo, seria mais fácil se o dever defensivo recaísse sobre quem estivesse no setor no momento e não a um jogador individualmente. Se acontecer de Hazard estar na direita, que ele volte e ajude Iva. E isso valeria para os outros dois. Seria uma boa alternativa: a marcação seria mantida e a criatividade ofensiva revigorada.

Mas sabemos: Hazard vai atacar pela esquerda e Willian pela direita. Oscar vai se aproximar do lado em que o Chelsea estiver atacando. E com isso, até mesmo perdemos um dos meias, que não pode se aproximar de mais dos seus companheiros, pois precisa estar no seu setor de marcação para caso o Chelsea perca a bola.

Um sistema mais fluido ofensivo seria uma ótima alternativa, até mesmo com troca de posições entre o centroavante e um dos meias, com Costa (ou Remy ou Falcao) abrindo para o lado, fazendo por um momento a função de ponta para atrair a marcação, para que um dos meias possa se infiltrar e receber a bola com a defesa aberta. Mas não é o que vemos. Temos posições marcadas o que acaba prejudicando muito a ofensividade do Chelsea.

E isso acaba ficando mais evidente com o mau momento de Fàbregas, que ao contrário da temporada passada, já não ajuda ofensivamente. Com a marcação nos meias, em 2014/2015, Fàbregas subia até a intermediária livre e conseguia dar o último passe ou mesmo atrair a marcação que deixava um dos meias livres para receber a bola e se infiltrar.

Porém agora, em 2015/2016, ele não sobe tanto e quando o faz não acerta tantos passes e se movimenta pouco. E sem a subida de Cesc, o sistema de marcação espelhada que os adversários fazem sempre no Chelsea, funciona muito bem, pois nossas peças ofensivas além de estarem sempre nas mesmas posições, acabam estando todas com um marcador encostado e outro na sobra, deixando a vida ofensiva do Chelsea ainda mais difícil. Willian e Hazard (ou Pedro) recebem a marcação do ala adversário e ainda do lateral do setor. Oscar é marcado por um dos volantes e ainda há outro na sobra, que ainda pode ajudar pelos lados. Diego Costa fica com dois zagueiros na marcação e potencialmente ainda aquele volante livre que falamos. E como nossos laterais não atacam muito e quando atacam o fazem sem muita eficiência, acabamos atacando com poucas peças.

Ou seja, ficamos presos na marcação, tatica e numericamente. Por isso o Fàbregas do início da temporada passada acaba fazendo muita falta. E por isso também a falta de movimentação dos meias e aproximação dos volantes é um fator tático decisivo para o mau momento do Chelsea.

De um lado o encaixe da marcação adversária e a desvantagem numérica. Do outro o vazio gerado pela necessidade de Willian e Oscar em buscar o jogo na defesa (Imagem: This11.com)
De um lado o encaixe da marcação adversária e a desvantagem numérica ofensiva. Do outro o vazio gerado pela necessidade de Willian e Oscar em buscar o jogo na defesa (Imagem: This11.com)

Outra alternativa seria a rotação no setor. Acontecia bem (apesar de pouco com Schürrle), e não aconteceu com Cuadrado. Mas mesmo assim uma única opção no banco é muito pouco. E é o que temos hoje: Pedro. Os outros dois (Kenedy e Traoré) são jovens e portanto, não podem ser vistos como reais alternativas para grandes momentos e sim como jogadores para entrar aos poucos e ganhar espaço. Podem até se provar grandes armas, mas é preciso mais uma alternativa para o meio e, vindo este jogador, que entre para jogar com Pedro sempre, descansando a nossa trinca de meias, fazendo uma rotação no sistema, diminuindo a questão da previsibilidade ofensiva.

A defesa, por outro lado, permanece como na temporada: previsível. A questão é que se antes era recorrente a segurança no setor, agora já sabemos antes dos jogos que vamos tomar sufoco. E os fatores que fazem com que isso aconteçam são muitos. Primeiro o momento ruim de alguns zagueiros, como Terry e Cahill (que não tem o mesmo nível da maioria do elenco). Os outros dois fatores mais importantes são os ditos ao longo do texto: a ausência de marcação dos volantes e o mau posicionamento de um dos laterais.

Isso faz com que a defesa do Chelsea esteja sempre exposta em excesso, recebendo jogadas que não passaram por muito embate no meio de campo ou na lateral direita, facilitando, e muito, o trabalho ofensivo das equipes que nos enfrentam. Na temporada passada tínhamos uma defesa bem protegida que agora, escancarada, acaba vulnerável e evidenciando problemas individuais dos nossos zagueiros.

Ouvimos muito nos últimos tempos que times devem atacar como um todo e defender como um todo. E essa máxima vale aqui, pois, o problema da zaga do Chelsea começa lá na frente, quando Hazard, por exemplo, não volta para marcar. Ou quando os volantes e laterais se mostram deficientes defensivamente. A culpa não é apenas dos zagueiros, e sim do time todo, que não funciona mais como um coletivo, tanto pelo sistema tático defasado quanto pelo mau momento de peças fundamentais para o sistema de jogo, como Terry, Ivanovic, Matic, Fàbregas, Hazard e Diego Costa.

Category: Competições

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Article by: Chelsea Brasil

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